NUM PAÍS DE GORDINHOS, NOVAS MEDIDAS CONTRA O SOBREPESO

NUM PAÍS DE GORDINHOS, NOVAS MEDIDAS CONTRA O SOBREPESO
Por: Antonio Celso da Costa Brandão.

Após mudanças em rótulos, governo faz alteração na merenda escolar e dará dicas alimentares. A revelação de que o País tem mais adultos gordos do que desnutridos foi, inicialmente, um prato indigesto para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tinha o Fome Zero como programa principal. Mas, passados quase dois anos da constatação do Instituto Brasileiro de Geografia e Pesquisa (IBGE) sobre o perfil nutricional do brasileiro, iniciativas do governo federal buscam reduzir o excesso de peso e a obesidade entre a população. Além de mudanças no cardápio da merenda escolar e na rotulagem de produtos, o Ministério da Saúde vai lançar, em novembro, um guia de bolso para promover a alimentação saudável. Versão resumida de uma publicação técnica lançada há exato um ano, no Dia Mundial da Alimentação, o guia traz, em linguagem acessível, informações fundamentais para tentar transformar o perfil nutricional do brasileiro: a proporção de obesos mais do que dobrou em três décadas, totalizando 38,8 milhões de adultos acima do peso, ante 3,8 milhões de desnutridos. Com 16 páginas ilustradas e coloridas, o livreto será distribuído para as secretarias de Saúde e equipes do Programa de Saúde da Família. Também estará na internet. 'O guia é de fácil entendimento. No Brasil, já temos uma mortalidade excessiva por doenças que poderiam ser evitadas com uma mudança alimentar. O quanto cada um vai mudar é algo pessoal, mas precisamos de políticas públicas que tentem induzir isso. Informação é prioridade', avalia a coordenadora da Política de Alimentação e Nutrição do ministério, Ana Beatriz Vasconcellos. Se a insuficiência de peso gera doenças, o excesso no consumo de alimentos com alto teor de gordura e açúcar segue igual caminho. Resulta em maior incidência de males crônicos, como diabete, hipertensão e problemas vasculares. Dados do ministério indicam que, em 2004, 90% das mortes por obesidade e diabete e entre 50% a 75% por doenças cardiovasculares poderiam ter sido evitadas. MERENDA ESCOLAR - Para tentar frear a escalada da obesidade no País, além do guia e das mudanças na rotulagem de alimentos industrializados - que agora devem informar a presença de gordura trans, por exemplo -, o governo federal decidiu alterar, no início do mês, a resolução que trata dos produtos básicos da merenda escolar. A intenção é estabelecer quais alimentos devem constar da lista, dando prioridade para itens mais nutritivos, crus, frescos e semi-elaborados. 'A promoção da alimentação saudável nas escolas é um ponto fundamental. O sobrepeso e a obesidade na população com mais de 10 anos tem crescido, assim como a hipertensão', observa Ana, acrescentando que há projetos de hortas escolares e restrições do comércio e da oferta de alimentos que não são considerados saudáveis, como frituras e produtos ricos em açúcar. Embora a Organização Mundial da Saúde recomende a ingestão diária de 400 gramas de frutas, legumes e verduras, no Brasil são consumidos apenas 130 gramas, com pequena variação por classe de renda. No município do Rio, as mudanças dentro das escolas foram pioneiras. Em 2002, a prefeitura vetou a venda refrigerantes e alimentos do tipo fast food nas cantinas da rede pública. Dois anos depois, o prefeito proibiu a propaganda de cigarros, bebidas e alimentos a menos de 200 metros da entrada das escolas municipais e particulares da educação infantil e fundamental. E a 1ª Vara da Infância e da Juventude publicou uma lista com 35 alimentos que devem ser banidos das escolas privadas, como biscoitos, salgadinhos e refrigerantes. No Ciep Presidente Agostinho Neto, da rede municipal do Rio, por exemplo, a refeição é à base de arroz, feijão, purê de batata e carne moída. Nada de doces ou refrigerantes. Os alunos aprovam, mas gostariam de um algo a mais. 'Gosto de fruta, de verdura, de feijão com arroz. Faz bem para a saúde. Mas bem que a gente podia ter um doce bem pequenininho', diz Edvânia Nunes de Oliveira, de 11 anos, aluna da 4ª série. Nutricionista da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso), Fernanda Psciolaro considera que a discussão já é um avanço. Mas acha que o tema deve ser mais evidente em sala de aula. De acordo com o IBGE, em 30 anos, a proporção de crianças e adolescentes do sexo masculino acima do peso subiu de 3,9% para 18%. Entre as meninas, o salto foi de 7,5% para 15,4%. Professora da Universidade Federal da Bahia, Lígia Amparo faz ponderações sobre os vetos. 'É preciso respeitar o direito à escolha, ao sabor, ao reconhecimento da identidade através da comida', afirma ela, que estudará o impacto dos discursos sobre alimentação saudável na relação que os baianos têm com acarajé, declarado Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil. - Karine Rodrigues - Fonte: Estado de São Paulo

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