Os ministérios da Economia e da Casa Civil preveem cortar cerca de R$ 1,6 bilhão do Ministério da Educação para o próximo ano. O corte é mais uma consequência da incompetência do ex-ministro Abraham Weintraub e seus assessores, que não apresentaram propostas, nem projetos para a área.
O atual ministro da Educação, Milton Ribeiro, disse em
entrevista à TV Globo que, como a gestão de Weintraub não executou o orçamento,
ou seja, não utilizou os recursos financeiros destinados ao ministério para a
realização de projetos ou atividades, vai ser muito difícil manter o dinheiro
na Pasta. Ribeiro citou como exemplo de má gestão, a ex- titular da Secretaria
de Educação Básica (SEB), Ilona Becskehazy, exonerada no último mês de agosto,
após ter ficado apenas quatro meses no cargo. Segundo ele, somente a SEB deixou
de executar mais de R$ 900 milhões do seu orçamento.
Os cortes devem chegar a R$ 1,1 bilhão na educação básica e
R$ 500 milhões no ensino médio. O retorno de R$ 1,6 bilhão ao orçamento da
educação só poderá ser feito se o Congresso Nacional assim decidir, disse
Milton Ribeiro, já que são os parlamentares que aprovam a destinação dos
recursos.
A falta de projetos para a educação vem desde a campanha
eleitoral de 2018, já que Jair Bolsonaro (ex-PSL) não apresentou nenhum projeto
para a área, afirma Janine Ribeiro, ex-ministro da Educação, no governo de
Dilma Rousseff (PT).
“O ex-ministro Vélez Rodríguez [demitido em abril de 2019]
não tomou nenhuma medida. O segundo, Weintraub, se dedicou a brigar as com as
universidades federais e tentar instituir o ‘Future-se’, de financiamento
privado das universidades federais e mudar a escolha dos reitores”, critica
Janine.
Se já não bastasse perder R$ 1,6 bilhão em seu orçamento, a
Educação no país pode ainda ser afetada negativamente se o Congresso Nacional
não regulamentar o novo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação
Básica (Fundeb) permanente aprovado em agosto último.
Pela proposta aprovada, haverá aumento gradativo até 2016 dos
atuais 10% para 23%, da complementação de recursos da União para a educação e a
garantia de que 70% dos recursos serão destinados ao pagamento da folha
salarial de todos os profissionais da educação. Para 2021, a previsão é que o
Fundo tenha recursos na ordem de R$ 150 bilhões.
Caso o Congresso não regulamente o Fundeb, caberá ao governo
federal tomar a iniciativa por meio de uma Medida Provisória (MP), o que
preocupa os profissionais da educação, como o presidente da Confederação
Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo, e o ex-ministro
Janine Ribeiro.
Como o novo Fundeb foi aprovado como Emenda Constitucional
(EC), não poderá haver veto presidencial, a não regulamentação, mas abre a
possibilidade do governo mexer na destinação dos seus recursos, impactando nos
repasses destinados a estados e municípios, já que o fundo é a receita desses
entes, em 2020, que somadas garantem o custo do aluno para o ano seguinte e
define qual a participação financeira da União.
"Pode acontecer um desastre se chegarmos em janeiro do
próximo ano sem os entes federados terem condições financeiras para pagar
salários e manter as escolas funcionando"
- Heleno Araújo
O receio do presidente da CNTE é que o governo possa mexer
nas ponderações (veja quadro abaixo), que são os índices de repasses que cada
etapa do ensino tem direito.
“O governo pode mudar as ponderações, o que pode reduzir o
repasse para o ensino básico e aumentar para o ensino técnico. A MP pode
interferir nessa distribuição, do que vai para a educação infantil,
profissional. Se reduz para a educação infantil reduz o repasse para o
município, se aumenta o profissional, aumentam os recursos para os estados.
Defendemos que as ponderações sejam as mesmas definidas durante os debates de
aprovação do Fundeb”, ressalta Heleno Araújo.
A falta de regulamentação traz preocupação, pois as medidas
do atual governo demonstram que ele não tem se preocupado com a qualidade da
educação. Nem a promessa inicial de se ocupar com a educação básica, o governo
cumpriu, destaca Janine Ribeiro.
“Numa eventual MP, a chance de meter os pés pelas mãos na
distribuição de recursos é gigantesca já que o Fundeb tem como uma das mudanças
importantes o aumento de número de municípios atendidos, de 1.500 para 2.700.
Isso é muito positivo, vai ter mais dinheiro e crianças beneficiadas”, ressalta
o ex-ministro da Educação.
No entanto, Ribeiro reforça que não houve por parte do
governo medidas legislativas e administrativas no tocante à educação básica.
“É muito preocupante se levarmos em conta que 80% dos
estudantes do ensino básico estão na educação pública” afirma.
Além da distribuição dos recursos do Fundo, o presidente da
CNTE, Heleno Araújo, teme que com a Medida Provisória, o governo não dê
estrutura jurídica e legal para o piso do magistério.
“Por isso que é importante, neste momento, manter o diálogo
com Congresso na construção da regulamentação”, conclui.
Projeto de regulamentação do Fundeb chega ao Congresso
Para evitar que o governo edite uma Medida Provisória
regulamentando o Fundeb, a deputada Professora Dorinha (DEM/ TO) apresentou um
Projeto de Lei (PL) nº 4372/2020, sobre o tema.
O deputado Idelvan Alencar (PDT-CE) que também assina o PL,
se diz preocupado com o destino dos recursos do Fundeb, embora acredite que o
Congresso acabe votando o projeto para evitar uma MP à revelia do que foi
debatido e construído no Congresso Nacional até a aprovação do fundo.
“As principais questões são sobre a educação infantil, como
gastar e distribuir esses novos recursos, conseguir resultados e aumentar as
vagas em creches. Nosso objetivo é tornar as redes de ensino mais iguais. Mas,
o grande desafio é a matemática, fazer as pessoas entenderem a complementação e
os parâmetros de qualidade do ensino”, afirma Idelvan Alencar, que também foi
presidente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
>> Clique aqui para ler a íntegra do Projeto de
Lei
Pandemia escancara
problemas do ensino público
Para o ex-ministro da educação, Janine Ribeiro, embora
estados e municípios sejam os responsáveis pela educação básica e o ensino
médio, a pandemia do novo coronavírus (Covid- 19) escancarou a falta de
coordenação do governo federal para a educação brasileira.
“Na pandemia as escolas privadas ministram aulas remotamente
dentro do possível, mas é para quem pode pagar. No setor público tem ‘n’
problemas: professores sem equipamentos, alunos sem equipamentos para
acompanhar, não tem pacote de dados, quando acompanha é com celular do pai, da
mãe, que nem sempre estão disponíveis. Eles também não têm ambiente físico
adequado para prestar atenção”, critica Janine Ribeiro.
O ex-ministro da educação defende que o governo federal
poderia ter utilizado o Fundo de Universalização do Serviço de Telefonia
(FUST), formado por 1% do valor do que é pago nas contas telefônicas.
“Isso não é pouco. Poderia ser utilizado para instalar banda
larga nas periferias, com acessos à internet, dar pacote de dados aos
estudantes. É um recurso carimbado. O governo também poderia, no caso de
professores que não podem dar aulas remotas, utilizar gravações de material
didático que são de excelente qualidade”, afirma.
As críticas de Janine Ribeiro ao governo federal não são
somente em relação à educação, mas também à falta de propostas decentes para os
setores públicos em geral.
“Bolsonaro disse que se sente desagradavelmente surpreendido
com o auxílio emergencial, que repercutiu em favor dele, mas ele foi contra no
início. Hoje, quer manter o auxílio para garantir popularidade, mas não tem
dinheiro pra isso”, complementa.
"Mais do que dinheiro, falta competência deste governo
para fazer políticas sociais. E falta porque Bolsonaro não gosta. Quem entende
de políticas sociais, ele demite"
- Janine Ribeiro
Para o ex-ministro da Educação, todos os governos anteriores
de Itamar Franco a Fernando Henrique Cardoso fizeram políticas sociais, mas há
de se reconhecer que os governos do PT souberam construir mais do que ninguém,
políticas sociais.
“Uma coisa é dar R$ 600,00 de renda mínima, outra é promover
vacinação gratuita, entender os fatores de exclusão social e ir atrás dessas
pessoas excluídas e integrá-las à sociedade. Eles não têm noção disso. Mesmo
que Bolsonaro, os ministros Paulo Guedes [Economia], Braga Netto [Casa Civil] e
Rodrigo Maia [presidente da Câmara] queiram colocar mais dinheiro no social,
falta competência, porque o governo não sabe fazer porque é míope, não enxerga”,
afirma Janine Ribeiro.
(CUT Brasil, Rosely Rocha, 22/09/2020)
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